Enquanto o agronegócio e a indústria sentem a pressão da tarifa de 50% anunciada pelos Estados Unidos para entrar em vigor em 1º de agosto, o governo federal mantém-se omisso, e a missão parlamentar que desembarcou em Washington carece de interlocução direta com autoridades norte-americanas de alto nível. A iniciativa, aprovada por unanimidade no Senado em 15 de julho, completa-se apenas agora com a chegada dos senadores Carlos Viana (Podemos-MG), Jaques Wagner (PT-BA) e Rogério Carvalho (PT-SE), reunindo no domingo (27) a delegação completa para uma simples reunião interna de alinhamento .
A comissão externa, coordenada pelo presidente da Comissão de Relações Exteriores (CRE), senador Nelsinho Trad (PSD-MS), busca retomar o diálogo institucional com o Legislativo dos EUA em meio à escalada de barreiras tarifárias que já levou frigoríficos a suspenderem parte da produção destinada ao mercado norte-americano, com risco iminente de demissões em massa . No entanto, essa resposta tardia do Parlamento contrasta com a ausência de iniciativas proativas do Palácio do Planalto, que até o momento não agendou encontros formais entre o presidente Lula ou o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, e autoridades norte-americanas responsáveis pela definição dessas tarifas.
Na agenda oficial, os senadores limitam-se, na manhã desta segunda-feira (28), a um encontro na residência da embaixadora Maria Luiza Viotti com diplomatas brasileiros e, à tarde, a uma reunião na Câmara Norte-Americana de Comércio com lideranças empresariais . Não há qualquer registro de audiências marcadas com o Escritório do Representante de Comércio dos EUA (USTR), integrantes do Senado dos Estados Unidos ou membros do governo Biden, que detêm o poder decisório sobre as medidas protecionistas em vigor.
Essa falta de interlocução de alto nível expõe a inércia do Executivo: apesar de se reunir com o senador Trad em 23 de julho para fornecer dados do Itamaraty, o governo federal manteve-se calado nos dias cruciais após o anúncio da sobretaxa, deixando a missão parlamentar buscar sozinha seu roteiro de negociações . A cobrança por uma postura mais “firme” não vem apenas de opositores: a senadora Tereza Cristina (PP-MS), integrante da comissão, criticou publicamente a morosidade do governo ao exigir que o Brasil adote negociações mais incisivas diante do “tarifaço” de Donald Trump .
Enquanto isso, o agronegócio — carro-chefe das exportações nacionais — já sente os efeitos práticos da indefinição: frigoríficos suspenderam embarques e há previsões de demissões generalizadas nos próximos dias, o que pode comprometer a geração de emprego e a balança comercial do país . Sem uma frente executiva articulada junto à Casa Branca e ao Congresso americano, os esforços meramente parlamentares correm o risco de se limitar a gestos protocolares, sem impacto real na reversão da tarifa.
A missão do Senado partiu com pompa, mas esbarra na fragilidade de uma estratégia nacional: sem o protagonismo do Executivo, sem negociações diretas nos níveis mais altos e com agenda restrita a encontros de bastidores, o Brasil entra na contramão de missões diplomáticas eficientes. Resta saber se a viagem produzirá algo além de declarações de intenção ou se servirá apenas para evidenciar a ausência de comando do governo federal em momento tão crítico.
Sobre o autor
Hamilton Silva é jornalista e economista formado pela Universidade Católica de Brasília. Atua há 13 anos como editor-chefe do portal DFMobilidade.
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