A defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro protocolou nesta quinta-feira (7) sua resposta à acusação apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR), alegando diversas irregularidades processuais que, segundo o advogado Paulo Cunha Bueno, “ferem de morte” a denúncia. O documento contesta a competência do Supremo Tribunal Federal (STF) para julgar Bolsonaro e aponta supostas violações no acordo de delação premiada do tenente-coronel Mauro Cid, além de questionar a ausência de um juiz de garantias no processo.
Em um texto duro, Bueno criticou a falta de acesso integral da defesa aos autos da investigação. “Vieram aos autos apenas os elementos que arrimaram a acusação, sonegando-se os demais à nossa análise, sem qualquer justificativa plausível”, afirmou o advogado, sustentando que a defesa tem sido submetida a um “cerceamento” que compromete a credibilidade do processo. Ele classificou a investigação como “semissecreta” e afirmou que, agora, o Brasil assiste a uma “ação penal semissecreta”, na qual apenas as provas que interessam à acusação são apresentadas.
A denúncia da PGR e os bastidores do caso
A PGR acusa Bolsonaro de envolvimento na falsificação de cartões de vacinação contra a Covid-19 e no suposto planejamento de um golpe de Estado após sua derrota nas eleições de 2022. O cerne da acusação se baseia na delação de Mauro Cid, que detalhou reuniões e estratégias do ex-presidente para contestar o resultado das urnas. A Procuradoria argumenta que há indícios suficientes para sustentar a denúncia e levar Bolsonaro a julgamento.
No entanto, a defesa do ex-presidente insiste que a delação de Cid contém “máculas” e que há um direcionamento da investigação para condená-lo sem garantir o direito à ampla defesa. Segundo Bueno, “comprometer a amplitude de defesa é, antes de tudo, comprometer a credibilidade do próprio processo”.
Julgamento político ou jurídico?
Os argumentos da defesa reforçam a tese, sustentada por Bolsonaro e seus aliados, de que o ex-presidente está sendo alvo de um julgamento político. Ao questionar a legitimidade do STF para conduzir o caso, a estratégia jurídica busca transferir o processo para instâncias inferiores, onde o ex-presidente poderia ter um julgamento menos exposto ao que seus apoiadores chamam de “pressões políticas”.
Enquanto isso, a PGR sustenta que a investigação corre dentro da legalidade e que as provas apresentadas são suficientes para demonstrar a responsabilidade de Bolsonaro nos atos investigados. O embate jurídico promete se arrastar por meses, com possíveis novos desdobramentos no cenário político.
Desafios e próximos passos
O caso representa um teste para o sistema judicial brasileiro e para a resistência política de Bolsonaro, que se mantém ativo no cenário político mesmo diante de investigações e possíveis condenações. O ex-presidente já enfrenta inquéritos no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e, agora, se vê diante de uma ofensiva no STF que pode comprometer sua elegibilidade para 2026.
O Supremo ainda avaliará os argumentos da defesa e decidirá os próximos passos do processo. Caso aceite a denúncia, Bolsonaro poderá se tornar réu e responder formalmente às acusações, em um julgamento que pode definir seu futuro político.
Leia abaixo o texto que o Advogado publicou nesta noite:
Protocolizamos, há pouco, a resposta à acusação em nome do Presidente Jair Bolsonaro.
A despeito das diversas impropriedades processuais, que nulificam e ferem de morte a acusação — como a (in)competência da Corte e da Turma, as máculas no acordo de colaboração premiada do Coronel Mauro Cid e, ainda, a necessidade de ampliar-se o conceito do juiz de garantias aos processo em trâmite no STF —, é bem de se ver que o cerceamento a que a defesa vinha e continua a ser submetida representa, por sem dúvida, a chaga mais profunda a inquinar uma das ações mais emblemáticas de nossa história jurídica.
A defesa ressente-se e padece da falta de acesso à integralidade dos elementos colhidos na investigação, sendo-lhe disponibilizada só e somente aqueles previamente selecionados pelas autoridades de persecução penal.
Por outras palavras, vieram aos autos apenas os elementos que arrimaram a acusação, sonegando-se os demais à nossa análise, sem qualquer justificativa plausível, como se coubesse a acusação deliberar previamente sobre o que é ou não é importante para a defesa.
A amplitude de defesa é uma conquista do direito penal moderno e representa um dos pavimentos mais profundos da democracia. Comprometê-la é, antes de tudo, comprometer a credibilidade do próprio processo.
Disse e redisse ao longo da fase de inquérito que estava lidando com uma investigação semissecreta. Hoje lidamos com uma ação penal semissecreta.