O ex-ministro da Justiça Anderson Torres disse, nesta terça-feira (8), à Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) dos atos de 8 de janeiro que a minuta apreendida em sua casa pela Polícia Federal no dia 10 de janeiro é uma “aberração jurídica” e que não foi descartada por “descuido”.
“A polícia encontrou um texto apócrifo, sem data, uma minuta absurda. Minuta do golpe é verdadeira aberração jurídica e não foi ao lixo por descuido” prosseguiu.
O ex-ministro disse não se lembrar quem entregou o documento e que sequer conhece as condições em que o material foi produzido. Torres argumentou que costumava levar documentos do Ministério da Justiça para ler em casa por causa da sobrecarga de trabalho. Segundo ele, os materiais considerados relevantes eram devolvidos à pasta, já as informações sem pertinência eram descartadas.
Torres era Secretário de Segurança Pública do Distrito Federal quando manifestantes romperam uma barreira de proteção à Praça dos Três Poderes e depredaram o Palácio do Planalto, além das sedes do Congresso e do Supremo Tribunal Federal (STF).
Torres virou um dos principais investigados pela Polícia Federal (PF) sobre as articulações políticas para tentativa de golpe. Ele viajou para os Estados Unidos no dia 5 de janeiro, com a justificativa de que sairia de férias, apesar dos alertas de inteligência para os riscos de tumulto nos atos convocados para Brasília no dia 8 de janeiro. As férias de Torres só estavam marcadas para o dia 9 de janeiro.
Para esta terça-feira, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes decidiu que Torres será ouvido na condição de testemunha, “tendo o dever legal de manifestar-se sobre os fatos e acontecimentos relacionados ao objeto da investigação”.
Moraes, contudo, assegurou o direito do ex-ministro de Bolsonaro de se manter em silêncio quando for questionado sobre fatos que possam incriminá-lo. A liminar garante ao depoente a mesma condição dada ao ex-ajudante de ordens da Presidência Mauro Cid, que optou pelo silêncio absoluto durante todo o seu depoimento à comissão no mês de julho.
A decisão de Moraes ainda impõe a Torres a proibição de contato pessoal e individual com os senadores Flávio Bolsonaro (PL-RJ) e Marcos do Val (Podemos-ES) por também figurarem como alvos de investigações que miram a atuação do ex-ministro da Justiça.
Chegou na CPMI, na última quinta-feira (3), um relatório da Polícia Civil do Distrito Federal que analisa a movimentação financeira de Torres e outros investigados. De acordo com o documento, o ex-ministro repassou R$ 220 mil para sua irmã, R$ 40 mil para sua mãe e R$ 30 mil para sua esposa no ano passado. Os policiais destacaram ainda a transferência de um total de R$ 55,7 mil também no ano passado para o empresário Julio Carlos Correia, sócio da PH Recursos Humanos, uma empresa que possui diversos contratos com o governo federal.
Procurado pelo Estadão, o advogado de Torres, Eumar Novacki, informou que o ex-ministro pode esclarecer esses pagamentos aos parlamentares e que não há nenhuma preocupação quanto a isso. A defesa de Torres pediu ao ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), para que o ex-ministro tenha o direito de não responder a perguntas que possam incriminá-lo, mas também foi solicitada autorização para que Torres possa falar sem descumprir as restrições impostas pela corte. Não havia ainda decisão de Moraes.
A defesa de Torres afirma que esses R$ 55,7 mil repassados para o sócio da PH Recursos Humanos foram gastos pela compra de passagens de avião para os Estados Unidos.
“Foram compras de passagens da viagem que ele fez para os Estados Unidos. Estamos com os bilhetes impressos. O repasse para a irmã foi por uma sala que ele comprou com ela. Para a mãe, foi uma cirurgia. Não há nada atípico na movimentação financeira dele. Todo o dinheiro que entrou nas contas dele veio do governo, através de conselho de administração, ou do trabalho como delegado ou ministro” afirmou Novacki ao Estadão.
Torres foi preso no dia 14 de janeiro, assim que pousou no Aeroporto de Brasília, quando voltava das férias nos Estados Unidos. Ele ficou encarcerado até o dia 14 de maio, quando foi solto por decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).
A senadora Eliziane Gama (PSD-MA), relatora da CPMI, diz que Torres “tem muitas explicações a dar ao país”. Ao Estadão, ela afirma que o principal ponto em torno do qual o ex-ministro da Justiça deve ser questionado é a minuta, que foi encontrada na residência dele após os atos do 8 de janeiro.
“É preciso que ele mostre a verdade dos fatos, como por exemplo os detalhes e circunstâncias do caso que envolve uma minuta de uma GLO encontrada na sua casa. Esperamos que ele traga respostas detalhadas sobre o dia 8 de janeiro. A expectativa é que ele o faça sem tergiversar, não seja evasivo e principalmente cumpra com a verdade. A CPMI não será tolerante com mentiras, porque vulgarizam os trabalhos da comissão” disse a senadora.
*PN