Em esforço para impulsionar a indústria automotiva nacional e atender a metas de sustentabilidade, o governo federal prepara um decreto que instituirá o programa “Carro Sustentável”, popularmente apelidado de “novo carro popular”. A iniciativa, coordenada pela Casa Civil em conjunto com o MDIC (Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços), foi confirmada à coluna de Paula Gama pelo próprio MDIC, e estará formalizada em ato presidencial nos próximos dias.
Critérios e alcance
Poderão se beneficiar da isenção de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) todos os veículos de fabricação nacional que atendam simultaneamente aos seguintes requisitos:
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Potência inferior a 90 cv;
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Propulsão a biocombustíveis (incluindo motores flex);
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Produção no Brasil;
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Preço de tabela até cerca de R$ 80 000 (valor aproximado baseado no Kwid de entrada).
A medida valerá até 31 de dezembro de 2026 e deverá remover integralmente a alíquota de 7 % atualmente aplicada aos carros 1.0, o que resultaria em economia média de R$ 5 500 no preço de um Renault Kwid, por exemplo.
Modelos contemplados
Levantamento preliminar aponta que pelo menos 11 veículos produzidos no país enquadram-se nos critérios técnicos, entre eles:
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Renault Kwid;
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Fiat Mobi;
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Chevrolet Onix e Onix Plus (versões de entrada);
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Citroën C3 e C3 Aircross (modelo Basalt);
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Fiat Argo;
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Hyundai HB20 e HB20S;
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Volkswagen Polo e T-Cross.
Impacto orçamentário e compensações
Em 2023, programa semelhante consumiu cerca de R$ 1,5 bilhão em poucos meses. Para assegurar o cumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal, a nova isenção exigirá contrapartidas financeiras. Segundo especialistas, parte do impacto será compensada por:
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Aumento progressivo do imposto de importação sobre veículos eletrificados (híbridos e elétricos puros) até 2026;
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Aplicação do IPI Verde (bônus-malus), dentro do programa Mover, que penalizará automóveis mais poluentes e importados, conforme critérios de eficiência energética e reciclabilidade .
O sistema “bônus-malus” do IPI Verde já foi detalhado em lei sancionada em junho de 2024, no âmbito do Mover, prevendo a variação de alíquotas de IPI de acordo com indicadores ambientais e tecnológicos, e com regras claras de compensação via créditos financeiros para P&D.
Desafios de financiamento
Embora a redução de preço possa estimular vendas, analistas alertam que a alta dos juros — que chegam a 29,5 % ao ano no crédito ao consumidor — ainda representa a principal barreira de acesso ao carro zero-quilômetro para a classe média. Para frotistas e locadoras, com maior poder de negociação, o incentivo será mais efetivo; já o comprador pessoa física dependerá de condições de crédito mais competitivas.
Panorama histórico
O conceito de carro popular remonta a 1993, no governo Itamar Franco, com a isenção quase total de IPI para veículos 1.0, que consagrou o Fiat Uno Mille como “carro do povo”. Contudo, aquela política gerou distorções — como a exclusão da fabricante nacional Gurgel — e foi revista nos anos seguintes. Em 2023, a experiência de redução de IPI também apresentou efeito de curtíssimo prazo e concentração de benefícios em grandes frotistas.
Perspectivas
O sucesso do “Carro Sustentável” dependerá de dois fatores decisivos:
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Regulamentação clara e previsível das alíquotas bônus-malus e dos critérios ambientais;
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Aprimoramento das linhas de crédito para pessoa física, com condições que efetivamente diminuam o custo total do financiamento.
Sem essas medidas estruturais, advertem interlocutores do setor, o programa corre o risco de ser apenas mais um paliativo em meio ao ambiente de forte aperto fiscal e competitividade externa.
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