A sucessão no Grupo Silvio Santos e no SBT tem ares de mistério. Já nonagenário, o apresentador continuava à frente dos negócios com seu jeitão centralizador. Silvio Santos, porém, tinha um plano para o futuro de suas empresas – embora não revelasse quase nada sobre o que planejava para seu legado.
O apresentador morreu neste sábado (17), aos 93 anos, em decorrência de broncopneumonia após infecção por influenza (H1N1).
A preparação para passar o bastão das companhias do grupo ganhou força em 2016, quando o SBT – a principal empresa da holding – enfrentou outra de suas grandes crises.
A emissora, que fatura em torno de R$ 1,1 bilhão e tem lucro líquido estimado (não há publicação de balanços regulares) em R$ 40 milhões, encerrou o ano de 2016 com lucro líquido de R$ 6,6 milhões, menos de um décimo dos ganhos registrados um ano antes. Em 2015, os lucros haviam sido de R$ 76,1 milhões, de acordo com os resultados divulgados na época.
Uma das dificuldades da emissora sempre foi a combinação de baixa receita e custos muito altos. Para fechar essa equação e sair dessa última crise, o Grupo Silvio Santos contratou a consultoria americana McKinsey, referência em reestruturação de negócios. A ideia era organizar as contas e – também – a sucessão do empresário e apresentador, segundo apuraram veículos de imprensa entre 2015 e 2016.
Em 2017, depois de conseguir uma economia de R$ 100 milhões, que custaram aproximadamente 200 empregos, o SBT conseguiu ter lucro contábil de R$ 38,6 milhões, segundo o balanço da época.
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Filhas na sucessão
Para a sucessão de Silvio Santos, a ideia foi privilegiar duas das seis filhas do apresentador: a caçula Renata, de 36 anos, e Daniela, de 45. Renata, dizem no mercado, vem sendo preparada para ser presidente do grupo desde 2010.
Foi naquele ano que as empresas de Silvio viveram seu maior desafio financeiro: o Banco Panamericano, então propriedade do apresentador, teve um rombo de R$ 4 bilhões provocado por fraudes entre 2006 e 2010. O problema começou com a venda da carteira de créditos para outras instituições financeiras. A questão é que funcionários do banco vendiam esses créditos, mas ainda lançavam esse dinheiro no balanço para maquiar resultados.
Foi no meio desse momento sensível que Silvio Santos colocou o sobrinho Guilherme Stoliar para assumir o comando da holding. O poder, então, era dividido entre Stoliar, as filhas – principalmente Renata – e Silvio Santos, que sempre dava a decisão final.
“O grupo, faz tempo, conta com bons profissionais na gestão. Mas a palavra final é sempre do Silvio. Mesmo agora na pandemia, quando esteve afastado, em casa. E ele faz tudo da cabeça dele: uma hora, contrata vários jornalistas e, na outra, acaba com a divisão de jornalismo. Sempre foi assim”, disse uma fonte do mercado publicitário que preferiu não se identificar.
Foi na pandemia que Stoliar, depois de 49 anos no grupo, deixou o cargo. As rédeas do negócio passaram de vez para Renata em agosto de 2020.
Assim como suas irmãs, Renata Abravanel estudou nos Estados Unidos durante a vida toda. Ela se formou em administração de empresas pela Liberty University, uma universidade evangélica particular sem muita expressão, em Lynchburg, no estado da Virgínia.
“Ele é meu mentor. Gosto de observar como meu pai conduz reuniões, sua visão e o jeito como ele trata as pessoas”, disse a executiva à Folha de S.Paulo, em uma rara entrevista, em 2014. “É óbvio que estamos trabalhando na sucessão. Toda função importante tem de ter um plano B. Porém, Silvio Santos é insubstituível”, acrescentou Renata, que é casada com o empresário Caio Curado desde 2015 e mãe de Nina (4) e Daniel (2).
Das seis filhas, Renata é a mais discreta, a que menos aparece em frente às câmeras. Sob seu comando, estão não só a emissora como também as afiliadas do SBT (TVs em São Paulo, Rio, Brasília e Porto Alegre), o hotel Jequitimar, no Guarujá, a marca de cosméticos Jequiti, a Liderança Capitalização, a Sisan Empreendimentos e a SS Participações. Todas as empresas têm executivos do mercado no comando, inclusive o SBT.
Direção da emissora de Silvio Santos
A emissora, que possui mais de 40 anos, é presidida há quase uma década por José Roberto Maciel. Foi ele, por exemplo, que contratou diretores comerciais vindos da Globosat. Esses novos executivos foram responsáveis recentemente por uma das estratégias mais ousadas – em termos de SBT – dentro do canal aberto: a aposta em transmissões de futebol.
O SBT comprou os direitos de competições sul-americanas e obteve bons índices de audiência com as transmissões. A emissora também passou a investir nos últimos anos em conteúdo online, lançando o site SBT News.
Mas Maciel não está desacompanhado no comando. Ele conta, na direção da emissora, com o braço direito de Renata, a irmã dela, Daniela Abravanel Beyruti, de 44 anos, diretora executiva do SBT. Também formada pela Liberty University, nos Estados Unidos, ela tem diploma em comunicação social e trabalha na emissora desde 2010.
Foi responsável por variar um pouco a programação do canal – sempre muito focado em séries como “Chiquititas” e programas de auditório. Foi ela quem comprou formatos como o de “10 years younger” (10 anos mais jovem), “What not to wear” (Esquadrão da moda), e “Britain’s got talent” (Qual é o seu talento?).
Mas quem substituiria Silvio Santos na tela?
Das seis filhas do apresentador, Patricia, Rebeca e Silvia se aventuraram como apresentadoras. Cíntia, a mais velha, cuida apenas do Teatro Imprensa e é mãe do ator Tiago Abravanel.
Filha adotada de Silvio Santos aos três dias de idade, Silvia é produtora, dubladora e conhecida por comandar o programa de televisão Bom Dia & Companhia desde julho de 2015.
Patricia já apresentou vários programas e gosta de ser “influencer” na internet. É casada com o ex-ministro das Comunicações Fábio Faria, que também já foi deputado federal.
Atualmente, Patricia Abravanel já apresenta o Programa Silvio Santos no SBT.
Fatiamento da holding
Enquanto o lugar de Silvio à frente das câmeras ainda é uma incógnita, o destino das empresas do grupo é mais previsível. Uma grande aposta do mercado é que o grupo seja, de alguma forma, fatiado.
Segunda maior empresa do grupo (depois do SBT), a Jequiti Cosméticos seria a primeira a ser vendida. A marca não tem indústria própria e passou recentemente por um processo de reestruturação.
Fontes de mercado têm a expectativa de que a Jequiti siga o mesmo caminho do Baú da Felicidade, que tinha 121 lojas e, em junho de 2011, foi comprado pelo Magazine Luiza por R$ 83 milhões.
Em 2023, a Jequiti teve aproximadamente R$ 3 bilhões em receita e R$ 248 milhões em lucros.