Em 3 de julho de 2025, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva desembarcou em Buenos Aires, no mesmo dia em que o juiz responsável autorizou sua visita à residência de Cristina Fernández de Kirchner, ex-presidenta da Argentina, sob prisão domiciliar desde 17 de junho após ter sua condenação de seis anos confirmada. Foi o primeiro encontro de alto nível que Kirchner recebeu desde o início do cumprimento da pena em casa, simbolizando um gesto de solidariedade política entre dois expoentes da esquerda latino-americana .
Cristina Kirchner, mandatária entre 2007 e 2015, teve mantida em 10 de junho de 2025, por unanimidade, a condenação imposta pela Suprema Corte da Argentina: seis anos de prisão por desvio de verbas em contratos de obras públicas e inabilitação perpétua para cargos públicos. A decisão, decorrente do chamado “caso Vialidad”, gerou debates acalorados sobre a independência do Judiciário e a aplicação de leis anti-corrupção .
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O gesto de Lula ganha contornos ainda mais carregados diante de seu próprio histórico judicial. Em 2017, ele foi preso após condenação por suposta corrupção na Petrobras, cumprindo 580 dias de detenção até que o Supremo Tribunal Federal anulou as sentenças em março de 2021, restabelecendo seus direitos políticos. Esse episódio tornou-se referência para narrativas de “lawfare” entre militantes petistas, reforçando a empatia do presidente com colegas de campo ideológico .
No âmbito diplomático, a visita suscitou preocupações. Ao optar por se reunir com Kirchner e deixar de lado interlocução com o presidente libertário Javier Milei, Lula expôs um alinhamento ideológico que contrasta com o princípio de neutralidade esperado de um anfitrião de cúpula. A ausência de encontro com Milei pode agravar já existentes atritos bilaterais e comprometer a governança conjunta do Mercosul .
Analistas alertam que tal demonstração pública de apoio político a uma líder condenada corre o risco de minar a credibilidade das instituições judiciais na região, reforçando a percepção de uso seletivo da Justiça para fins partidários. Por outro lado, segmentos alinhados ao PT celebram o ato como expressão de fraternidade e defesa dos direitos de defesa, destacando a tradição de solidariedade entre movimentos progressistas sul-americanos .
Desde 1º de julho de 2025, o Brasil exerce a presidência rotativa do Mercosul, bloco fundado em 1991 e fortalecido em 2007 com a criação do Mecanismo de Integração e Coordenação Bilateral (MICBIAR), que sistematiza a cooperação política e econômica entre Brasil e Argentina. A alternância no comando exige equilíbrio entre países de distintas orientações, realçando a carga simbólica de gestos como o de Lula em solo portenho .
No plano interno, parlamentares da oposição reagiram com veemência. Para o deputado Luciano Zucco (PL-RS), líder da minoria na Câmara, o encontro “transmite péssimo simbolismo para o Brasil”, pois o governo “optou por se solidarizar com líderes condenados em vez de respeitar instituições e boas práticas” .
À medida que o Brasil assume a presidência pro tempore do Mercosul, o desafio será equilibrar a defesa de valores democráticos e a promoção de uma agenda de integração sem ceder ao ativismo ideológico que possa comprometer a cooperação multilateral. O gesto de solidariedade, legítimo num plano pessoal, suscita dúvidas sobre seus reflexos na estabilidade política e na reputação internacional do país .
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