24% dos trabalhadores ultrapassam limite de comprometimento de 35% no novo consignado privado

Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil
Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil

Desde 21 de março de 2025, quando entrou em vigor o novo consignado privado — batizado de Crédito do Trabalhador pelo governo federal — um estudo da SalaryFits, braço da Serasa Experian, revelou que 24% dos trabalhadores que solicitaram o empréstimo consignado ultrapassaram o limite legal de comprometimento salarial de 35% definido pela Medida Provisória 1.292/2025 . A análise, divulgada nesta segunda-feira (2), aponta para um crescimento preocupante no endividamento de parcela significativa dos tomadores.

Na prática, a MP 1.292/2025 alterou a Lei 10.820/2003 para permitir que trabalhadores com carteira assinada — incluindo empregados rurais, domésticos e microempreendedores individuais (MEIs) — contratem crédito consignado diretamente pela CTPS Digital, sem necessidade de convênio prévio entre empresas e instituições financeiras . O mecanismo estabeleceu que as parcelas sejam descontadas via eSocial, observada a margem consignável de até 35% do salário bruto, mas não leva em conta descontos variáveis — como coparticipações de planos de saúde — que podem reduzir o salário líquido do colaborador.

O estudo da SalaryFits identificou ainda que 5% dos trabalhadores analisados mantinham mais de um contrato de empréstimo consignado privado ativo simultaneamente, prática atualmente vedada pelas novas regras . Segundo Délber Lage, CEO da SalaryFits, “alguns empregadores ainda utilizam parâmetros inconsistentes ou desconsideram verbas que deveriam compor o cálculo do comprometimento, o que pode levar a um comprometimento efetivo acima do teto de 35%” . Essa fragilidade no cálculo expõe funcionários a pressões financeiras adicionais, sobretudo quando já acumulam descontos fixos e eventuais na folha.

A pesquisa aponta, ainda, que 35% dos contratos do novo consignado privado foram firmados com financeiras que não mantinham pautas de parceria prévia com as empresas, diferentemente do modelo antigo . Em média, as organizações registram 40% de seus empregados com contratos ativos de empréstimos consignados, obrigando o setor de Recursos Humanos a lidar com um volume maior de informações e relatórios para controlar o fluxo dos descontos . “Ampliar o acesso do trabalhador a diversas instituições credoras é positivo, pois ele pode comparar propostas; porém, limitações operacionais podem sobrecarregar o RH e gerar inconsistências nos cálculos”, ressalta Lage.

Dados oficiais do Ministério do Trabalho indicam que foram liberados R$ 12,9 bilhões em empréstimos do novo consignado privado, para mais de 2,3 milhões de trabalhadores desde o lançamento, com valor médio de R$ 5.471,23 por contrato, prestação média de R$ 316,54 e prazo médio de 17 meses . Em comparação, relatório divulgado em abril pelo Ministério da Fazenda revelou que, apenas no primeiro mês de operação, as instituições financeiras concederam cerca de R$ 8 bilhões em novas operações de consignado a empregados com carteira assinada, sendo que entre 60% e 70% desses recursos foram utilizados para renegociação de dívidas, o que reduziu o valor das parcelas em até um terço para o consumidor .

A flexibilização proporcionada pela CTPS Digital facilitou a contratação, mas expôs lacunas operacionais: o sistema não ajusta automaticamente o cálculo da margem consignável para descontos variáveis, como planos de saúde ou contribuições sindicais, nem impede que o trabalhador combine múltiplas ofertas de diferentes credores sem um controle unificado . Como resultado, uma fatia considerável de tomadores acaba comprometendo mais de um terço da renda bruta com dívidas, o que eleva o risco de inadimplência e pode corroer o poder de compra.

Especialistas ouvidos pela reportagem alertam que a adoção de parâmetros mais precisos no cálculo do comprometimento e maior integração entre empregadores, bancos e sistema do eSocial são fundamentais para mitigar os efeitos negativos. Além disso, recomendam que o trabalhador avalie previamente sua capacidade de pagamento — considerando despesas fixas e variáveis — e compare as taxas oferecidas antes de firmar o contrato.

A consolidação do novo consignado privado faz parte de um esforço governamental para baratear o custo do crédito ao trabalhador, estimando movimentar até R$ 120 bilhões nos próximos anos, mas exige, por sua vez, aprimoramentos na fiscalização e na educação financeira dos tomadores de empréstimo . Até o momento, mais de 80 instituições financeiras estão habilitadas a operar a linha de crédito, e a portabilidade entre bancos só será permitida a partir de 6 de junho de 2025 .

Em Brasília, representantes do setor de RH de grandes empresas relatam que têm promovido treinamentos internos para esclarecer o cálculo da margem consignável e orientar os funcionários sobre os riscos de endividamento excessivo. Já entidades de defesa do consumidor recomendam que a supervisão do Banco Central seja ampliada para garantir a segurança dos processos eletrônicos e a veracidade dos parâmetros utilizados pelas plataformas digitais.


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