Mariana Naime, esposa do coronel da PMDF Jorge Eduardo Naime, afirmou em entrevista ao jornalista Luís Lacombe que o então interventor federal na segurança do Distrito Federal, Ricardo Cappelli, “mandou usar força letal” durante os eventos de 8 de janeiro de 2023 — e que seu marido resistiu à ordem, evitando um “derramamento de sangue”. “Mandando usar força letal, e isso é que é cruel, mandando usar força letal, sem nenhum documento, nenhum, zero”, disse Mariana. Em outro trecho, ela relata mensagens recebidas de manifestantes: “Eu escutei ele [Naime] protegendo e falando que não ia usar munição letal”.
Segundo Mariana, a recusa de Naime teria sido presenciada pelo ajudante de ordens do coronel e mencionada em audiência. “Está registrado… que evitou o derramamento de sangue, evitou que houvesse munições letais contra a população”, contou. Ao descrever o estado de espírito do marido, ela completou: “Eu consigo dormir em paz todos os dias… muitas pessoas estão soltas, estão livres, mas estão aprisionadas pela mente”.
Contexto e personagens — quem é quem
• Ricardo Cappelli foi nomeado interventor pelo Decreto nº 11.377, de 8 de janeiro de 2023, com poderes sobre a área de segurança pública do DF até 31 de janeiro daquele ano. Hoje, preside a Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI). Quer ser o governador do DF nas próximas eleições.
• Coronel Jorge Eduardo Naime Barreto: ex-chefe do Departamento de Operações da PMDF, foi preso preventivamente em fevereiro de 2023, permaneceu 461 dias detido e obteve liberdade provisória em maio de 2024, com medidas cautelares (tornozeleira, recolhimento noturno e aos fins de semana). Em 4 de agosto de 2025, Moraes autorizou sua ida a cultos dominicais; em 12 de agosto, o STF negou habeas corpus que buscava trancar a ação. A PGR pediu condenação de ex-integrantes da cúpula da PMDF por omissão.
O que dizem os registros oficiais
Relatórios e pronunciamentos públicos da intervenção não mencionam diretriz para emprego de munição letal contra civis. Em entrevistas e documentos, Cappelli descreveu uma tropa “atordoada e sem comando”, tensão com a cúpula da PM e “enfrentamento” com Naime — mas sem referência a ordem de letalidade.
Situação processual do coronel Naime
Naime responde no STF por suposta omissão no 8 de janeiro, ao lado de outros oficiais. O julgamento do grupo foi retirado de pauta em agosto e aguarda nova data. A decisão que lhe concedeu liberdade em 2024 manteve restrições até a conclusão do processo.
A fala de Mariana reabre a disputa narrativa sobre a cadeia de comando na crise de 8 de janeiro e atinge diretamente Cappelli — hoje pré-candidato em articulação para disputar o Governo do DF, visto por adversários como apadrinhado político de Flávio Dino. Para críticos, o episódio reforça a imagem de um “executante” de decisões do entorno do ex-ministro; para aliados, trata-se de uma acusação sem lastro documental e desmentida pelos atos oficiais da intervenção. (Decreto e relatórios públicos listados acima).
O que está claro e o que ainda falta responder
• Fato novo: a acusação pública de que houve ordem verbal para uso de força letal, atribuída a Cappelli por Mariana Naime.
• Há, até aqui, ausência de documento conhecido que comprove essa ordem — ponto sensível que exige esclarecimento formal das autoridades envolvidas.
Trechos da entrevista de Mariana (Lacombe, 20.ago.2025)
— “Mandando usar força letal… sem nenhum documento, nenhum, zero.”
— “Quero agradecer pela vida do seu marido, porque seu marido evitou mortes.”
— “Eu escutei ele protegendo e falando que não ia usar munição letal.”
— “O ajudante de ordens do Naime… declarou em audiência do STF.”
— “Eu consigo dormir em paz todos os dias.”
Esta reportagem se baseia na entrevista de Mariana Naime e em documentos/atos oficiais públicos sobre a intervenção, além do histórico processual de Naime no STF. Até a publicação, não localizamos registro oficial que confirme a alegada ordem de letalidade. Caso haja manifestação de Ricardo Cappelli ou da ABDI, o texto será atualizado.
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Hamilton Silva — jornalista, editor-chefe do DFMobilidade.